sexta-feira, 20 de agosto de 2010

BIENAL DO LIVRO DE 1970- O QUE O MUNDO LIA NA ÉPOCA?




Desde 1970 não ocorria isso: a Bienal do Livro teve ontem o maior público registrado em apenas um dia de evento.  Uma multidão de mais de 80 mil pessoas lotou o Anhembi, atraídos pela mágica do livro, pelo fascínio da literatura, pela possibilidade de conhecer novos lançamentos, novos autores, antigos livros reeditados, uma festa, enfim, como há muito não se via na Bienal.
A 1ª Bienal Internacional do Livro, promovida pela Câmara Brasileira do Livro, aconteceu há 40 anos, em agosto de 1970, no edifício da Bienal de Arte, no parque do Ibirapuera (local que a abrigaria até 1994). Ainda sem a cobertura midiática de hoje, centenas de editoras nacionais e internacionais estavam lá, contando inclusive com a presença de Jorge Luis Borges e do autor e crítico alemão Anatol Rosenfeld. Na primeira bienal não se comercializavam livros nos estandes, o que passou a ocorrer só a partir da terceira edição, em 76.
Quanta coisa mudou nesses 40 anos. Quantas transformações. Mudou o país, que em 1970 vivia uma clausura intelectual promovida pelo AI5 e pelas forças de direita que sufocavam a liberdade de expressão. Mudou o mundo, que em abril de 70 assistiu McCartney anunciar publicamente a dissolução dos Beatles, que em setembro do mesmo ano soube da morte de Hendrix, e em outubro de Joplin. Havia algo de novo na América Latina em 1970, quando Salvador Allende assumiu a presidência do Chile. A ficção científica já não era tão ficcional, e no mesmo ano, abril, o mundo perplexo viu a Apollo 13 explodir e depois chegar à Terra, quando devia ter chegado à Lua. Também em 70, a arte perdeu o Almada Negreiros, perdeu o poeta gaúcho Augusto Meyer, o filósofo Bertrand Russell e vários outros. O mundo da literatura em 1970 premiou o dissidente russo Alexander Soljenítsin (Nobel), a insípida Bernice Rubens (Booker Prize), o poeta americano Richard Howard (Pulitzer de Poesia), o romancista carioca Octavio de Faria (Prêmio Machado de Assis), Rubem Fonseca (Prêmio Jabuti de Contos) e Pedro Antonio de Oliveira Ribeiro Neto (Juca Pato).
Mas quais foram os best-sellers em 1970? O que líamos no ano da 1ª Bienal do Livro de São Paulo? O que o mundo consumia no mercado editorial? A lista dos livros mais vendidos da Publishers Weekly (publicação semanal norte-americana fundada em 1872, e que criou um dos mais importantes componentes de avaliação do consumo literário mundial), mostra que em 1970 o amor continuava em alta e o livro mais consumido naquele ano foi Love Story, de Erich Segal, seguido da obra-prima de John Fowles, A Mulher do Tenente Francês. No posto de terceira obra mais vendida de 70 está Hemingway, com as As Ilhas da Corrente, o último livro do autor, publicado nove anos após seu suicídio. Na sequencia, em quarto lugar, vem a sempre presente britânica Mary Stewart, com seu A Caverna de Cristal, da série sobre Merlin (guardião do rei Artur). Outra habitué na lista dos mais consumidos, a autora britânica Taylor Caldwell, entrou em quinto lugar com seu O Grande Amigo de Deus, ficção que narra a história de Lucas, o evangelista. Caldwell sempre encantou com sua preciosa e rica narrativa, e nesse livro ela nos “pega pela mão”, nos conduzindo para uma Jerusalém (cidade de Tarso) dos primeiros anos da era Cristã.
Segue a lista dos best-sellers de 1970 com cinco obras, algumas marcadas para sempre na história da literatura, outras devidamente esquecidas, como sempre ocorre. Pela ordem: QB VII, do brilhante Leon Uris,  O Traidor – A Verdadeira História da Máfia Americana, de Jimmy Breslin, The Secret Woman, de Victoria Holt (na realidade trata-se da britânica Eleanor Hibbert, uma das mais profícuas escritoras de ficção, que vendeu mais de 100 milhões de livros usando vários pseudônimos, como Jean Plaidy, Elbur Ford, Kathleen Kellow, Ellalice Tate, Anna Percival, Victoria Holt, etc.) e Travels with My Aunt , do “sagrado” romancista Graham Greene, em um de seus últimos livros, que como “O Cônsul Honorário” se passa em parte na América Latina. Finalizando a lista, em décimo lugar, vem Homem Rico, Homem Pobre, do também roteirista Irwin Shaw.
Se compararmos com a lista atual, da mesma Publishers Weekly, vamos perceber que o amor e a aventura continuam no gosto literário. Talvez hoje, na “pauta cenográfica” haja mais vampirismo, misticismo (mistério) e ocultismo, mas o que a massa de consumidores continua a querer mesmo é diversão, em geral com pouca fecundação filosófico-existencial e muito encantamento, magia e romance. Quarenta anos depois da 1ª Bienal Internacional do Livro vale a pena passear pela sua 21ª edição, caminhar por seus labirintos e descobrir que a produção literária, seja ela digital ou analógica, continua a deslumbrar as crianças e hipnotizar os adultos, bem mais do que fazia em 1970.

*Foto: Bienal do Livro
 por  Kelly de Souza - foto

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